Ser santo na família

terça-feira, 28 de junho de 2011 Diego Tales

Sagrada Família

Não sei se você ainda tem aquela mentalidade super-errada de achar que a santidade (ou seja, a plena felicidade em Deus, aqui e também, um dia, por toda a eternidade) é só para pessoas que têm o chamado ao sacerdócio ou à vida religiosa (freis, monges, irmãos de ordem), ou ainda para outras pessoas que não constituíram família de sangue.
Se este é o seu caso, é bom saber que a Igreja diz o contrário. Na verdade, afirma o oposto ao canonizar e beatificar pais e mães, casais e jovens, mostrando que é bastante possível, com a graça de Deus e nosso "sim", sermos santos trocando fraldas, cozinhando o almoço, passando a noite acordados ao lado do berço, indo buscar na escola, tendo paciência com os erros, sendo pais firmes, formando os filhos em Deus, orando por eles, participando da Eucaristia em família, trabalhando com dedicação para sermos canais da Providência para os nossos filhos, enfim, sendo família, família de Deus.
Aliás, a nenhuma outra instituição ou realidade, a Igreja "emprestou" o seu próprio nome, a não ser para a família, a qual a Santa Mãe Igreja chama, nada mais, nada menos, de "Igreja doméstica"!
Perceba-se, assim, você que é casado(a), totalmente em Deus quando você passa muito tempo na sua família, com seus filhos e cônjuge, tempo de amor, de convivência com qualidade e intensidade. Assim, você acolhe seu chamado à santidade.
E para aqueles que disserem o contrário, lembre-lhes os pais e mães, casais e jovens que a Igreja canonizou ou beatificou, isto é, declarou santos, virtuosos, bem-aventurados: Santa Gianna Beretta Molla (mãe-de-família, médica); os Beatos Luís e Zélia, pais de Santa Teresinha (beatificados não por terem sido os pais de Santa Teresinha, mas, como disse o Cardeal José Saraiva Martins, na missa de beatificação dos dois, "eles são duas testemunhas do amor conjugal"); o Beato Pier Giorgio Frassati, que faleceu bem jovem, sobre o qual disse o Servo de Deus o Papa João Paulo II: "Ele foi ativo e operoso no ambiente em que viveu, na família e na escola, na universidade e na sociedade".
Seja família de Deus, Igreja doméstica! Seja santo(a)!

Álvaro Amorim 
Comunidade Católica Shalom

O poder da oração

segunda-feira, 27 de junho de 2011 JESUS C. 'FONTE DE ÁGUA VIVA'


Jesus deixou patente o poder da prece: “Tudo o que pedirdes na oração, crede que o recebestes e vos será  dado” (Mc 11,14). Há,  evidentemente, condições para que isto aconteça. Como ressaltam  todos os grandes teólogos, o que se solicita a Deus não deve prejudicar a salvação eterna pessoal e das pessoas pelas quais se ora. Quando, contudo, o que se implorou ao poder divino não está de acordo com tal fim, Ele, na sua sabedoria eterna, dá sempre algo muito melhor condizente a seu plano salvador.

Como o Mestre divino insistiu em tantas outras passagens do Evangelho, é por meio da oração, e de nenhum outro modo sem ela,  que se conseguem de Deus as graças necessárias para o que se precisa para o corpo e para a alma. Para isto, a oração deve ter  um aspecto purgativo, ou seja, levando à purificação interior como aconteceu com Davi, que legou aos pósteros o salmo 50. O Filho pródigo (Lc 15) e o publicano (Lc 18) se justificaram por meio de uma prece sincera e. É que a oração não só limpa a alma de qualquer falta, como a preserva de erros futuros. Além disto, a prece ilumina o coração como ocorreu com Moisés, com os  Patriarcas e Profetas. Lembra São João Crisóstomo que “como o sol clarifica tudo, assim a oração é a luz da alma”. É que a prece une o fiel a seu Senhor e o metamorfoseia como aconteceu com os Apóstolos que, recebendo o Divino Espírito Santo, se transformaram em cristãos perfeitos (Atos 1). São Tiago dá este conselho: “Se algum de vós carece de sabedoria, peça-a a Deus que a dá generosamente a todos sem censura, e ser-lhe-á dada. Peça-a, porém, todas as vezes com fé, sem hesitação” (Tg 1,5-6). A prece torna o cristão familiar com Deus e faz dele um iluminado. A razão é simples: quem trata com o Sábio e o Santo por essência dele recebe saber e santidade. Aquele ora se adianta  então nas virtudes e vence as dificuldades da natureza humana.
A prece, além de tudo isto, é a chave do céu, a arma poderosa contra as insídias do maligno, a armadura do soldado espiritual. É desta maneira que, ou meditando ou proferindo preces vocais,  se imerge no oceano da sabedoria e do poderio do Todo-Poderoso. Santo Agostinho declarou que ele se comovia   saboreando os hinos e cânticos, emocionado ao ouvir as vozes da Igreja, que tão bem soam aos  ouvidos. É durante a vida toda que se deve cultivar o espírito de oração, inclusive pelo oferecimento freqüente de tudo que se faz e que deve ser realizado unicamente para a glória de Deus. Assim se percorrem as diferentes maneiras de comunicação da alma com Deus, caracterizadas  pela maior ou menor simplicidade do pensamento e do afeto. Todos os batizados podem e devem usufruir dos talentos da oração, ou seja, das diferentes graças que o Espírito Santo  concede a cada um, para que ela possa viver  com Ele de modo habitual. É o que lembrou São Tiago: “Toda a dádiva boa e todo o dom perfeito vem do alto, descendo do Pai das Luzes, no qual não há variação nem sombra de mudança” (Tg 1,16). Para serem captadas as inspirações vindas do Senhor é preciso, contudo,  uma devoção sólida que flui do coração que quer continuamente aderir à vontade divina, reconhecendo, porém, a grandeza de Deus e pequeneza humana, o que é fundamental, segundo Santo Tomás de Aquino em qualquer tipo de oração. Eis aí uma condição essencial para a eficácia da prece, de tal  modo que o Senhor conceda ao orante o que ele pede. É o efeito sublime da consideração da própria indigência espiritual e da misericórdia e largueza divinas. O orgulhoso quer manipular a Deus e se julga digno de todos os favores celestes. É deste modo que o cristão vence os estorvos e obstáculos que o Inimigo multiplica para impedir o seguidor de Jesus trilhar os caminhos da oração.
Mesmo os grandes santos tiveram que lutar contra as inquietudes ou agitações de ânimo que roubam a tranquilidade necessária para o trato com Deus. Diz São João da Cruz que “o bem espiritual não se imprime senão na alma moderada e posta em paz”. Segundo São Bernardo a causa da inquietude é sempre a falta de total confiança na  paternal providência de Deus. É necessário também vencer a divagação da fantasia que impede que o entendimento se fixe naquilo que se diz ou se medita. Quando, porém, alguém coloca dentro do Coração de Jesus suas preocupações, fica menos sujeito às distrações e sua prece se torna ainda mais poderosa.
Con. José Geraldo Vidigal

A fé é amiga da inteligência

JESUS C. 'FONTE DE ÁGUA VIVA'

 O teólogo Ruiz Aldaz comenta a relação entre fé e razão
O encontro do cristianismo com o helenismo foi providencial. Destaca isso o teólogo Ruiz Aldaz nesta entrevista concedida a Zenit, na qual aborda os temas que Bento XVI colocou em sua conferência em Ratisbona, ou seja, a relação entre fé e razão sobre a base comum da busca da verdade.
O professor Ruiz Aldaz discute este tema em seu livro «O conceito de Deus na teologia do século II. Reflexões de J. Ratzinger, W. Pannenberg e outros» (Eunsa).
Ruiz Aldaz recorda que o Papa, em sua conferência em Ratisbona, sublinhava precisamente a «coincidência de fundo entre a revelação bíblica e a filosofia grega».
Ruiz Aldaz (Pamplona, 1969) é sacerdote da diocese de Pamplona – Tudela e professor de Teologia na Universidade de Navarra. Entre seus estudos se destaca a reflexão sobre a Trindade e a teologia de São Gregório de Nisa.
Em Ratisbona o Papa aludiu ao encontro entre cristianismo e filosofia grega. Você em seu livro afirma que o encontro do cristianismo com o helenismo foi providencial. Por quê?
Ruiz Aldaz: Um dos permanentes centros de atenção do magistério de Bento XVI é a estreita relação que existe entre fé e razão. Em suas próprias palavras, a fé é «amiga da inteligência». Sua aula em Ratisbona em setembro do ano passado sublinhava precisamente a coincidência de fundo entre a revelação e a filosofia grega: o que não é conforme a razão é contrário à natureza de Deus.
Aristóteles começa sua grande obra de metafísica afirmando que todos os homens desejam saber. A aspiração a conhecer a verdade do divino, do próprio homem e do mundo pertence à essência do espírito humano.
Os filósofos da antiga Grécia tiveram o mérito de desenvolver uma ciência para conhecer a verdade exercitando as capacidades da inteligência humana. A grande questão que a inteligência humana se propõe é a questão da verdade.
A fé cristã é uma mensagem verdadeira. Se nos interessa a fé é porque é verdade. Se limitasse a ser um relato fantástico, seria boa literatura, mas não chegaria a satisfazer a aspiração mais profunda do espírito humano: encontrar o Deus vivo e verdadeiro.
Por isso, a fé precisa da razão: para mostrar o grau de seriedade de seu compromisso com a verdade e aprofundar em seu conhecimento. Fé e filosofia se encontram porque ambas buscam a verdade. Daí que possa afirmar-se que o encontro da fé cristã com a filosofia grega fora providencial.
Assim, o cristianismo se deveria «des-helenizar» do todo ou é bom que conserve este influxo grego?
Ruiz Aldaz: Os resultados a que conduz o projeto de «des-helenizar» o cristianismo estão patentes na história da teologia. Quando Bento XVI emprega a palavra «des-helenizar», quer dizer arrancar o cristianismo sua dimensão racional. Isto tem muitas conseqüências: significa privar o cristianismo de sua intrínseca relação com a verdade, impedir um autêntico diálogo da fé com os demais saberes, reduzi-lo a um puro fenômeno subjetivo e negar-lhe a legitimidade para entrar nos grandes debates filosóficos e éticos do mundo contemporâneo.
Que contribuem os teólogos W. Pannenberg, L. Scheffczyk e J Ratzinger ao debate sobre o conceito de Deus nos primeiros teólogos?
Ruiz Aldaz: Entre 1959 e 1999 se desenvolveu um interessante debate em torno à forma em que os primeiros teólogos empregaram alguns conceitos da filosofia grega para aprofundar no conceito cristão de Deus e propô-lo ao mundo greco-romano.
Os teólogos do século II partiam da convicção de ter conhecido em Jesus Cristo a revelação suprema de Deus. Seu trabalho consistiu em selecionar que conceitos da filosofia grega eram mais apropriados para expressar o mistério do Deus cristão e defini-los de tal forma que não o desfigurassem.
Neste debate participou um considerável número de teólogos de diversas confissões cristãs. Os mais importantes são, com efeito, Pannenberg, Scheffczyk e Ratzinger. Enquanto que Pannenberg, teólogo evangélico, aporta uma postura mais bem crítica deste trabalho, Ratzinger defende a lucidez dos primeiros teólogos ao tomar a filosofia como interlocutora privilegiada e Scheffczyk corrobora a idéia de que em seu esforço intelectual estes teólogos selecionaram com acerto que tipo de conceitos filosóficos eram mais adequados para expressar o conteúdo da fé.
Deus como «ser pessoal» supera as expectativas da filosofia grega. Que dizia o teólogo Ratzinger sobre isto?
Ruiz Aldaz: Ratzinger sustenta que na base do politeísmo está a idéia de que por cima das diversas divindades, existe uma lei universal impessoal que governa toda a realidade, inclusive aos deuses do Olimpo. Este é o espírito que impregna o mundo cultural greco-romano: a divindade mais alta não é um ser com o qual o homem possa se comunicar.
Para os gregos, não cabe uma relação pessoal com a divindade primeira. É uma verdade sem religião.
Uma das contribuições decisivas da revelação cristã é afirmar que o único Deus verdadeiro é o que criou tudo com sua inteligência e com seu amor. De acordo com este dado fundamental e com a fé na Encarnação, os primeiros teólogos afirmaram que Deus é um ser com quem o homem pode se comunicar.
É um ser pessoal que estabelece com o ser humano uma relação pessoal de conhecimento e amor. Ou seja, a verdade e a religião guardam uma perfeita harmonia.
Fonte: Zenit

O pecado nos prejudica?

JESUS C. 'FONTE DE ÁGUA VIVA'



Com o nobre intuito de nos libertar dos complexos de culpa, das fixações mórbidas, e das doentias tendências para escrúpulos intermináveis, a humanidade joga duro contra a existência do pecado. O espírito de permissividade exige liberação de todos os tabus. Não há mais limites para as mentes livres. Praticar atos ilícitos seria uma busca de saúde mental. Garantiria uma consciência leve. Seria a libertação das inibições destruidoras. O que nos liberta, no entanto, é a verdade e não a enganação. "A verdade vos libertará" (Jo 8, 32) já avisava Jesus. Uma personalidade madura sabe distinguir entre um desarranjo psicológico, e uma culpa verdadeira, que devemos reconhecer. O pecado é um mal, que nos fere no nosso "eu". O Criador generoso, conhecendo a nossa constituição, para evitar o caminho dos desvios, já nos deu as instruções sobre o que devemos fazer positivamente, e o que devemos evitar. Se praticarmos o mal a nossa alma fica ferida. No "self" se aninha o descontentamento. Não podemos ficar em paz porque fizemos o mal ao nosso semelhante; ofendemos o amor paterno de Deus; e cedemos às más tendências do egoísmo. Com isso nos afastamos dos irmãos. Você quer conhecer uma personalidade mais sadia do que São Paulo? E ele dizia com convicção: "Jesus Cristo veio para salvar os pecadores, dos quais eu sou o primeiro" (1Tim 1, 15).
Existe remissão do pecado? A minha consciência pode ser purificada dessa potência maléfica? A primeira condição é reconhecer o erro. "Tende pena de mim que sou pecador" (Lc 18, 13) dizia o publicano. E junto com isso, devemos avivar a fé na pessoa de Cristo, que é o grande libertador. Assim começamos a arrebentar a rede de permissivismo que perpassa o mundo de hoje. Quem quer se livrar do peso inútil do mal, particularmente quando se trata de faltas menores, deve fazer obras de caridade em favor do próximo, ler com fé a Sagrada Escritura, amar a Deus especialmente na oração, participar de celebrações litúrgicas. Isso nos purifica e centra a alma. Mas sobretudo devemos nos aproximar do sacramento da penitência, sacramento concedido por Jesus, que tem o poder de perdoar qualquer pecado. Não seria uma ótima tarefa para a quaresma que se inicia?

Dom Aloísio Roque Oppermann

A oração de Elias e o fogo de Deus

sábado, 25 de junho de 2011 Diego Tales

Apresentamos, a seguir, a catequese dirigida pelo Papa aos grupos de peregrinos do mundo inteiro, reunidos na Praça de São Pedro para a audiência geral. O pronunciamento faz parte da série sobre orações.
Queridos irmãos e irmãs
Na história religiosa do antigo Israel, os profetas tiveram grande relevância, com seus ensinamentos e sua pregação. Entre eles, surge a figura de Elias, suscitado por Deus para levar o povo à conversão. Seu nome significa “o Senhor é meu Deus” e é de acordo com este nome que se desenvolve toda a sua vida, consagrada inteiramente a provocar no povo o reconhecimento do Senhor como único Deus. De Elias o Eclesiástico diz: “O profeta Elias surgiu como o fogo, e sua palavra queimava como tocha” (Eclo 48,1). Com esta chama, Israel volta a encontrar seu caminho rumo a Deus. Em seu ministério, Elias reza: invoca o Senhor para que devolva a vida ao filho de uma viúva que o havia hospedado (cf. 1Re 17,17-24), grita a Deus seu cansaço e sua angústia, enquanto foge pelo deserto, jurado de morte pela rainha Jezabel (cf. 1Re 19,1-4), mas sobretudo no monte Carmelo, onde se mostra todo o seu poder de intercessor, quando, diante de todo Israel, reza ao Senhor para que se manifeste e converta o coração do povo. É o episódio narrado no capítulo 18 do Primeiro Livro dos Reis, no qual hoje nos deteremos.
Encontramo-nos no reino do Norte, no século IX antes de Cristo, em tempos do rei Ajab, em um momento em que Israel havia se criado uma situação de aberto sincretismo. Junto ao Senhor, o povo adorava Baal, o ídolo tranquilizador de quem se acreditava que vinha o dom da chuva e a quem, por isso, se atribuía o poder de dar fertilidade aos campos e vida aos homens e às bestas. Ainda pretendendo seguir o Senhor, Deus invisível e misterioso, o povo buscava segurança também em um deus compreensível e previsível, de quem acreditava poder obter fecundidade e prosperidade em troca de sacrifícios. Israel estava cedendo à sedução da idolatria, a contínua tentação do crente, figurando-se poder “servir a dois senhores” (cf. Mt 6,24; Lc 16,13) e de facilitar os caminhos inescrutáveis da fé no Onipotente, colocando sua confiança também em um deus impotente feito por homens.
Precisamente para desmascarar a necedade enganosa dessa atitude, Elias reúne o povo de Israel no monte Carmelo e o coloca diante da necessidade de fazer uma escolha: “Se o Senhor é o verdadeiro Deus, segui-o; mas, se é Baal, segui a ele” (1Re 18, 21). E o profeta, portador do amor de Deus, não deixa sua gente sozinha diante desta escolha, mas o ajuda, indicando o sinal que revelará a verdade: tanto ele como os profetas de Baal prepararão um sacrifício e rezarão, e o verdadeiro Deus se manifestará respondendo com o fogo que consumirá a oferenda. Começa assim a confrontação entre o profeta Elias e os seguidores de Baal, que na verdade é entre o Senhor de Israel, Deus de salvação e de vida, e o ídolo mudo e sem consistência, que não pode fazer nada, nem para bem nem para mal (cf. Jr 10,5). E começa também a confrontação entre duas formas completamente diferentes de dirigir-se a Deus e de rezar.
Os profetas de Baal, de fato, gritam, agitam-se, dançam, pulam, entram em um estado de exaltação, chegando a fazer-se incisões no corpo, “com espadas e lanças, até o sangue escorrer” (1Re 18,28). Usam a si mesmos como recurso para interpelar o seu deus, confiando em suas próprias capacidades de provocar sua resposta. Revela-se assim a realidade enganosa do ídolo: este está pensado pelo homem como algo de que se pode dispor, que se pode gestionar com as próprias forças, a que se pode aceder a partir de si mesmos e da própria força vital. A adoração do ídolo, ao invés de abrir o coração humano à Alteridade, a uma relação libertadora que permita sair do espaço estreito do próprio egoísmo para aceder a dimensões de amor e de dom mútuo, fecha a pessoa no círculo exclusivo e desesperador da busca de si mesma. E o engano é tal que, adorando o ídolo, o homem se vê obrigado a ações extremas, na tentativa ilusória de submetê-lo à sua própria vontade. Por isso, os profetas de Baal chegam até a causar-se dano, a retalhar-se, em um gesto dramaticamente irônico: para obter uma resposta, um sinal de vida do seu deus, eles se cobrem de sangue, recobrindo-se simbolicamente de morte.
Muito diferente é a atitude de oração de Elias. Ele pede ao povo que se aproxime, envolvendo-o assim em sua ação e em sua súplica. O objetivo do desafio dirigido por ele aos profetas de Baal era o de voltar a levar a Deus o povo que se havia extraviado seguindo os ídolos; por isso, quer que Israel se una a ele, convertendo-se em partícipe e protagonista da sua oração e do que está acontecendo. Depois, o profeta erige um altar, utilizando, como recita o texto, “doze pedras, segundo o número das doze tribos dos filhos de Jacó, a quem Deus tinha dito: 'Teu nome será Israel'” (v. 31). Essas pedras representam todo Israel e são a memória tangível da história de eleição, de predileção e de salvação de que o povo foi objeto. O gesto litúrgico de Elias tem uma repercussão decisiva; o altar é o lugar sagrado que indica a presença do Senhor, mas essas pedras que o compõem representam o povo, que agora, por mediação do profeta, está colocado simbolicamente diante de Deus, converte-se em “altar”, lugar de oferenda e de sacrifício.
Mas é necessário que o símbolo se converta em realidade, que Israel reconheça o verdadeiro Deus e volte a encontrar sua própria identidade de povo do Senhor. Por isso, Elias pede a Deus que se manifeste, e essas doze pedras, que deveriam recordar a Israel sua verdade, servem também para recordar ao Senhor sua fidelidade, à qual o profeta apela na oração. As palavras da sua invocação são densas em significado e em fé: “Senhor, Deus de Abraão, de Isaac e de Israel, mostra hoje que tu és Deus em Israel, e que eu sou teu servo e que é por ordem tua que fiz estas coisas. Ouve-me, Senhor, ouve-me, para que este povo reconheça que tu, Senhor, és Deus, e que és tu que convertes o seu coração!” (v. 36-37; cf. Gn 32, 36-37). Elias se dirige ao Senhor chamando-o de Deus dos Pais, fazendo memória implícita, assim, das promessas divinas e da história de eleição e de aliança que uniu indissoluvelmente o Senhor e o seu povo. O envolvimento de Deus na história dos homens é tal, que seu Nome já está inseparavelmente unido ao dos Patriarcas, e o profeta pronuncia esse Nome santo para que Deus recorde e se mostre fiel, mas também para que Israel se sinta chamado pelo seu nome e volte a encontrar sua fidelidade. O título divino pronunciado por Elias parece, de fato, um pouco surpreendente. Ao invés de usar a fórmula habitual, “Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó”, ele utiliza um apelativo menos comum: “Deus de Abraão, de Isaac e de Israel”. A substituição do nome “Jacó” pelo de “Israel” evoca a luta de Jacó no vau de Jaboc, com a mudança de nome a que o narrador faz referência explícita (cf. Gn 32,31) e de que falei em uma das catequeses passadas. Esta substituição adquire um significado a mais dentro da invocação de Elias. O profeta está rezando pelo povo do reino do Norte, que se chamava precisamente Israel, diferente de Judá, que indicava o reino do Sul. E agora, este povo, que parece ter esquecido sua própria origem e sua própria relação privilegiada com o Senhor, sente que o chamam pelo seu nome, enquanto se pronuncia o Nome de Deus, Deus do Patriarca e Deus do Povo: “Senhor, Deus (…) de Israel, mostra hoje que tu és Deus em Israel”.
O povo por quem Elias reza é colocado diante da sua própria verdade e o profeta pede que também a verdade do Senhor se manifeste e que Ele intervenha para converter Israel, afastando-o do engano da idolatria e levando-o, assim, à salvação. Sua petição é que o povo finalmente saiba, conheça em plenitude quem é verdadeiramente seu Deus, e faça a escolha decisiva de seguir somente Ele, o verdadeiro Deus. Porque somente assim Deus é reconhecido pelo que é, Absoluto e Transcendente, sem a possibilidade de colocá-lo junto a outros deuses, que O negariam como absoluto, relativizando-o. Esta é a fé que faz de Israel o povo de Deus; é a fé proclamada no bem conhecido texto do Shema‘ Israel: “Ouve, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças” (Dt 6,4-5). Ao absoluto de Deus, o crente deve responder com um amor absoluto, total, que comprometa toda a sua vida, suas forças, seu coração. E é precisamente para o coração do seu povo que o profeta, com sua oração, está implorando conversão: “Que este povo reconheça que tu, Senhor, és Deus, e que és tu que convertes o seu coração” (1Re 18,37). Elias, com sua intercessão, pede a Deus o que o próprio Deus deseja fazer, manifestar-se em toda a sua misericórdia, fiel à sua própria realidade de Senhor da vida que perdoa, converte, transforma.
E isso é o que acontece: “Caiu o fogo do Senhor, que devorou o holocausto, a lenha, as pedras e a poeira, e secou a água que estava no rego. Vendo isto, o povo todo prostrou-se com o rosto em terra, exclamando: “É o Senhor que é Deus, é o Senhor que é Deus!'” (v. 38-39).
O fogo, este elemento ao mesmo tempo necessário e terrível, ligado às manifestações divinas da sarça ardente e do Sinai, agora serve para mostrar o amor de Deus que responde à oração e se revela ao seu povo. Baal, o deus mudo e impotente, não havia respondido às invocações dos seus profetas; o Senhor, no entanto, responde, de forma irrevocável, não só queimando o holocausto, mas inclusive secando toda a água que havia sido derramada ao redor do altar. Israel já não pode duvidar; a misericórdia divina saiu ao encontro da sua fraqueza, das suas dúvidas, da sua falta de fé. Agora, Baal, o ídolo vão, está vencido, e o povo, que parecia perdido, encontrou o caminho da verdade e se reencontrou.
Queridos irmãos e irmãs, o que esta história do passado nos diz? Qual é o presente desta história? Antes de tudo, está em questão a prioridade do primeiro mandamento: adorar somente a Deus. Onde Deus desaparece, o homem cai na escravidão de idolatrias, como mostraram, em nossa época, os regimes totalitários, e como mostram também diversas formas de niilismo, que tornam o homem dependente de ídolos, de idolatrias, o escravizam. Segundo, o objetivo primário da oração é a conversão: o fogo de Deus que transforma nosso coração e nos torna capazes de vê-Lo e, assim, de viver segundo Deus e de viver para o outro. E o terceiro ponto. Os Padres nos dizem que também esta história de um profeta será profética se – afirmam – for sombra do futuro, do futuro Cristo; é um passo no caminho rumo a Cristo. E nos dizem que aqui vemos o verdadeiro fogo de Deus: o amor que guia o Senhor até a cruz, até o dom total de si. A verdadeira adoração de Deus, então, é doar-se a Deus e aos homens, a verdadeira adoração é o amor. E a verdadeira adoração de Deus não destrói, mas renova, transforma. Certamente, o fogo de Deus, o fogo do amor queima, transforma, purifica, mas precisamente assim não destrói, e sim cria a verdade do nosso ser, recria nosso coração. E assim, realmente vivos pela graça do fogo do Espírito Santo, do amor de Deus, somos adoradores em espírito e verdade.
No final da audiência, o Papa cumprimentou os peregrinos em vários idiomas. Em português, disse:
Queridos irmãos e irmãs
Na história religiosa de Israel, sobressai a figura de Elias, cujo nome significa: “O meu Deus é o Senhor”. E, com o nome concorda a sua vida, toda ela votada a provocar no povo de Israel - que se extraviara atrás dos ídolos – o regresso ao Senhor seu Deus. Um dia reuniu o povo no Monte Carmelo, desafiando-o a escolher entre o Deus verdadeiro e os ídolos. Tanto ele, o profeta do Senhor, como os profetas de Baal vão preparar um sacrifício sem atear o fogo; depois cada um invoca o seu Deus. Aquele dos dois que responder, enviando o fogo para queimar o sacrifício, será o verdadeiro Deus. Elias rezou assim: “Respondei-me, Senhor, para que este povo reconheça que sois o verdadeiro Deus e converteis os seus corações”. Com a sua súplica, pede a Deus aquilo que o próprio Deus deseja fazer: manifestar-Se em toda a sua misericórdia, fiel à própria realidade de Senhor da vida que perdoa e converte. E o Senhor responde, enviando o fogo que consome a vítima do sacrifício. E o povo reencontrou a estrada da verdade, reencontrou-se a si mesmo: “O Senhor é o nosso Deus”.
Amados peregrinos de língua portuguesa, uma saudação amiga de boas-vindas para todos, com menção especial para os fiéis das paróquias de Nossa Senhora da Conceição, em Angola, São Sebastião de Campo Grande, no Brasil, e São Julião da Barra, em Portugal. Possa esta peregrinação ao túmulo dos Apóstolos ajudar-vos na vida a cooperar plenamente com os desígnios de salvação que Deus tem sobre a humanidade. Como estímulo e penhor de graças, dou-vos a minha Bênção.
Fonte: Zenit

Igreja: A Esposa de Cristo

sexta-feira, 24 de junho de 2011 Diego Tales


A presença de Cristo na vida da sua Igreja não se realiza de modo simbólico, mas de uma maneira muito mais íntima que se possa imaginar. Existe, de fato, uma relação profunda que é expressa particularmente pela união esponsal. Ele quis uni-la a si por meio de uma aliança indissolúvel e, mesmo que não esteja presente fisicamente no meio de nós, Ele está de forma sacramental e esponsal no seu corpo místico: a Igreja, sua esposa.
No Antigo Testamento, vemos Deus revelar-se de modo progressivo. Essa revelação conhece várias etapas. Em alguns profetas, e, de modo particular em Oseias, a aliança conhece uma etapa fundamental, pois a relação de Deus com o seu povo passa a ser compreendida como um “pacto matrimonial”. Deste modo, Deus, que já tinha manifestado de várias formas o seu amor, inclusive como amor materno, agora, apresenta-se como Esposo para manifestar de um modo mais profundo o seu amor e eleição.
Essa imagem esponsal nos revela que Deus é o Esposo fiel: “Desposar-te-ei novamente para sempre, desposar-te-ei conforme a justiça e o direito, com misericórdia e amor. Desposar-te-ei com fidelidade, e tu conhecerás o Senhor” (cf. Os 2,21-22). Essa é uma escolha de Deus diante do povo que muitas vezes agia com infidelidade.
Embora a Aliança, muitas vezes, seja violada por parte do povo, Deus nunca desiste. Assim, prepara o seu povo para um “pacto esponsal”, o qual encontra o seu ápice na união esponsal de Cristo com a Igreja – novo Israel – adquirido pelo seu sacrifício na Cruz.
Santo Ambrósio afirmava: “Da mesma forma que Eva foi tirada do lado de Adão adormecido, assim, a Igreja nasceu do coração traspassado de Cristo morto na Cruz”. A Igreja nasce do Coração traspassado do Cordeiro Pascal que a amou e, por ela, entregou-se (cf. Ef 5,25). A oferta de Cristo na cruz é esponsal. Ele entrega a si mesmo de modo inaudito. Podemos constatar que, entre Cristo e a Igreja, há uma união esponsal que a torna uma com o Esposo, e essa união é indestrutível, pois nem mesmo as fraquezas da Igreja podem anular esse amor esponsal. É o Esposo divino que lhe assegura o seu amor e a sua graça constantemente, tornando-a bela e sem mancha, pois não há pecado, fraqueza ou miséria que Ele não vença e purifique pelo poder do seu sacrifício.
No Novo Testamento, Jesus é claramente apresentado por João Batista como o Esposo, aquele que marca a conclusão de um tempo, ou seja, a Antiga Aliança e o início da Nova e Eterna Aliança realizada pelo sangue do Cordeiro. É a voz do amigo do esposo que o apresenta sem hesitação como o Cordeiro e Esposo. Torna-se mais belo ainda vê o próprio Jesus atribuir a si mesmo o título de Esposo (cf. Mc 2,19). Nele toda profecia a esse respeito encontra o seu real e pleno cumprimento, pois Ele é o Esposo, que celebra as núpcias com a sua amada esposa.
Podemos afirmar que a Igreja, como Corpo místico de Cristo, revela-nos a sua plena comunhão com Ele e, como esposa de Cristo, faz-nos contemplar a sua relação íntima com Cristo. Há uma união misteriosa e real entre Jesus Cristo e a sua Igreja, de tal modo que essa esposa é um mistério, pois, assim como o seu Esposo é homem e Deus, assim a esposa assemelha-se a Ele de forma humana e divina.
Nesta união esponsal, a Igreja, realidade nova, nascida do Sacrifício do Cordeiro, recebe tudo do seu esposo, pois é própria do amor verdadeiro a comunhão, seja do coração, seja da própria vida. Portanto, a ela está destinado o vinho novo do Esposo, e, por isso, ela é santificada por Ele. A Igreja, a bem amada, vive aqui na terra essa realidade, mas se prepara em meio a tribulações, sofrimentos e alegriasna espera pelo encontro final com Ele e,cheia de saudade e de bem-aventurada esperança, clama: “Vinde, Senhor Jesus!” (cf. Ap 22,20).
No capítulo 17 do Evangelho de João, Ele pede ao Pai que a sua Esposa seja uma com Ele assim como Ele é um com o Pai. Portanto, Ele está unido de tal modo à Igreja, que não podemos pensar nele e, ao mesmo tempo, excluí-la e, muito menos, desejar o que muitos pretendem: “sim” a Cristo e “não” a Igreja. “Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por mãe”, afirmava São Cipriano.

Padre Rômulo dos Anjos Silva
Missionário da Comunidade Católica Shalom

O CISCO NO OLHO

segunda-feira, 20 de junho de 2011 Diego Tales

Naquele tempo, Jesus contou uma parábola aos discípulos: “Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois num buraco? Um discípulo não é maior do que o mestre; todo discípulo bem formado será como o mestre. Por que vês tu o cisco no olho do teu irmão, e não percebes a trave que há no teu próprio olho?
Como podes dizer a teu irmão: Irmão, deixa-me tirar o cisco do teu olho, quando tu não vês a trave no teu próprio olho? Hipócrita! Tira primeiro a trave do teu olho, e então poderás enxergar bem para tirar o cisco do olho do teu irmão”. ( Lc 6,39-42)


O conhecimento abundante, disponibilizado pelos muitos meios e mecanismos existentes, hoje, no contexto da sociedade contemporânea mundial, bem como o acesso ao incalculável volume de informações têm configurado uma situação muito peculiar e perigosa. Parece ser incoerente e inexata uma asserção tal.


Ora, não é lógico, e é pouco racional pensar, que na medida em que se conhece mais e mais se obtém, com facilidade, informações em grande quantidade e necessárias se configurem riscos e prejuízos. Conhecimento e informações, de per si, têm a faculdade de evitar riscos, superar obstáculos e trazer benefícios.
Contudo, é verdade que o conhecimento ampliado e as informações numerosas estão conduzindo as pessoas numa dinâmica que não lhes tem permitido alcançar uma capacidade mais profunda, no dia a dia, no que diz respeito à autocrítica.


A autocrítica é um indispensável instrumento para que se conquiste, alimente e toda pessoa se mantenha dentro dos parâmetros e princípios éticos norteadores da vida comum do quotidiano e nas grandes questões. O fato é que o conhecimento e as informações estão especializando as inteligências nesta grande capacidade de avaliar e emitir juízos. Isso é bom? Obviamente que sim.


Qual é, então, o lado ruim da questão se é que ele possa existir? Este lado ruim existe sim. Sua existência é comprometedora para que valores éticos possam presidir mais a conduta, seja em nível individual quanto social e político, como condição sine qua non para içar a sociedade deste marasmo no qual ela está enterrada, abrindo-lhe um horizonte novo. Ora, assiste-se a um desenrolar de raciocínios e posicionamentos que apontam soluções para o problema da violência, por exemplo, quando se fala da diminuição da idade penal.
Este foco fica desconectado, por exemplo, da situação grave de impunidade que grassa na sociedade e a pouca eficácia no aparelhamento com mecanismos que permitam vencê-la. O calor das emoções, embora justas, pode obscurecer alguns pontos importantes, nesta luta para reorientar os fluxos desoladores que estão configurando o dia a dia da sociedade contemporânea.


Entre estes pontos não se pode, absolutamente, descartar a questão fundamental que é a capacidade de autocriticar-se. A especialização alcançada, mais ou menos por todos, tem exercitado as inteligências na direção de desferir juízos a respeito de situações várias, e de cada outro em particular.


É fácil julgar e condenar o outro. Como é forte o gosto para se cultivar maledicências, culpar os outros se eximindo de assumir responsabilidades. Em razão disso muita gente mente deslavadamente, acusa os outros, arma ciladas e, a todo custo, justifica sua própria situação e a mantém, ilusoriamente, convencida de se estar na direção certa. Já é uma subcultura perversa esta de justificar-se como bom na medida em que se desprestigia e encontra motivos, até mesmo falsos, para dizer que o outro não é e desmoralizá-lo.


Não é este um defeito peculiar da cultura contemporânea. Na verdade, esta é uma deficiência, de certo modo congênita, ao coração humano. É muito fácil criticar e emitir juízos a respeito dos outros e das situações em estando, enquanto juiz, de fora e distante. Por isso mesmo, as pessoas são extremamente exigentes quando se trata de reclamar os próprios direitos, de serem atendidas nos seus pleitos ou na satisfação de suas necessidades. O mesmo não se verifica, tendo como referência a si mesmo, quando diz respeito a respostas dadas aos outros, comprometimentos, a verdade dos fatos e uma generosidade solidária.


A maestria de Jesus tratou esta questão na condução dos seus discípulos. No Sermão da Montanha, Jesus, orientando a conduta dos seus seguidores, para dar-lhes um instrumento existencial eficaz na recuperação da ética e da condição de um agir moralmente correto, dialoga assim com os seus: “Por que observas o cisco no olho do teu irmão, e não reparas na trave que está no teu próprio olho? Ou, como podes dizer ao teu irmão: "Deixa-me tirar o cisco do teu olho", quando tu mesmo tens uma trave no teu? Hipócrita! Tira primeiro a trave que está no teu olho, e então enxergarás bem para tirar o cisco do olho do teu irmão” (Lc 6).


O juízo temerário é um risco, agravado pela falta de autocrítica. Aí está, incontestavelmente, uma raiz determinante desta falta de ética que vai permitindo tudo no que diz respeito a si mesmo, com a morbidez de julgar os outros, com uma perda lastimável e comprometedora da capacidade de, em primeiro lugar, fazer o próprio mea culpa. Este farisaísmo, condenado por Jesus, está medrando largamente nos corações, e assoreando a capacidade ética da solidariedade. O convite à conversão, neste tempo da quaresma, aponta nesta dinâmica, como capítulo primeiro. É a coragem de tirar primeiro o cisco do próprio olho. Este exercício abre caminho à solidariedade e ajusta a própria conduta.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo

Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte

É PRECISO UNIR E NÃO DIVIDIR...

Diego Tales

Santa Joana d’Arc, diante de seus juízes, resumia a fé dos santos Doutores da Igreja: "Quanto a Jesus Cristo e a Igreja, parece-me que são uma só coisa, e que não há questionamento sobre isto" (Catecismo nº 795).
Na Eucaristia recebemos o Corpo e Sangue de Cristo, de modo sacramental, a fim de se formar o corpo social de Cristo, na unidade de todos os seus membros.
São Paulo pergunta: "O cálice de benção que benzemos não é comunhão do sangue de Cristo ? E o pão que partimos não é a comunhão do corpo de Cristo?" (1Cor 10,16).


E o próprio Apóstolo responde: "Uma vez que há um só pão, nós, embora sendo muitos, formamos um só corpo, porque todos participamos do mesmo pão" (1Cor 10,17).


A Eucaristia forma a Igreja e a Igreja celebra a Eucaristia. Quando comungamos o seu Corpo e Sangue, cada um de nós se torna "consangüíneo" e "concorpóreo" com Ele, e parte viva do Seu próprio Corpo. A eucaristia nos faz "Cristóforos", isto é, portadores de Cristo, dizia S.Cirilo de Jerusalém (†386); e assim, como disse S.Pedro, "participamos da natureza divina" (2Pe 1,4).


É na Eucaristia, de modo especial, que todo o Corpo é alimentado pela Cabeça, e nela, os membros recebem a força e a graça para viver como verdadeiros cristãos, para que "Cristo seja formado neles" (Gal 4,19) e tenham força para "seguir os seus passos" (1Pe 2,21).


Na Oração Eucarística [III], pedimos ao Pai: "...concedei que, alimentando-nos com o Corpo e o Sangue do Vosso Filho, sejamos repletos do Espírito Santo e nos tornemos em Cristo um só Corpo e um só espírito".
Não se pode, portanto, separar Cristo da Igreja. Fazê-lo seria o mesmo absurdo de querermos degolar uma pessoa e querer que ela continue a viver.


Não se pode "degolar" o Corpo de Cristo; isto é, separá-lo da Igreja. Este foi o grande e triste engano de Martinho Lutero, em 1517, ao dizer Sim a Cristo e Não à Igreja; não percebeu que estava mutilando o Corpo de Cristo, degolando-o. A partir daí, as subdivisões foram acontecendo de maneira irreversível e irrefreável em todo o mundo. É o maior escândalo que o cristianismo já deu ao mundo.



Prof.Felipe de Aquino


AS RAZÕES DA ESPERANÇA

Diego Tales


O mundo em que vivemos, muitas vezes chamado de aldeia global pela diversidade de culturas que convivem com a proximidade oferecida pelos meios de comunicação, traz consigo o desafio da tolerância nas relações humanas e, ao mesmo tempo, a possibilidade de nos manifestarmos legitimamente, a fim de que tudo o que nos é próprio se transforme em dom a ser compartilhado.

Constata-se que o Cristianismo é hoje alvo de repetidas investidas, com as quais é questionado em seus princípios e orientações morais. Num tempo em que as espécies animais, as árvores e as águas são valorizadas como nunca – e com razão! – ser a favor da vida desde a concepção até a morte natural é considerado conservadorismo! As chamadas questões de gênero encontram artilharia pronta para mirar a Igreja e os cristãos, a ponto de os conceitos oriundos da Sagrada Escritura não poderem ser oferecidos para a formação das consciências.
 

É possível que o relato da criação que afirma ter Deus criado homem e mulher seja censurado por aí! Um rolo compressor pretende calar a voz da pregação corajosa do Evangelho, quando personalidades da Igreja se levantam para denunciar o tráfico de pessoas e de drogas. Em nossa região, chega-se ao ponto de personalidades eclesiásticas necessitarem de esquemas especiais de segurança para exercerem o direito de ir e vir.

Como ser cristão num ambiente paganizado? O primeiro passo é a certeza nascida da escolha de Deus, no seguimento de Jesus Cristo, não se envergonhando Dele nem de Seu Evangelho. A coerência com as opções feitas conduz ao respeito nas relações interpessoais. Já ouvi, de algumas pessoas, a manifestação de apreço aos cristãos que, mesmo debaixo de saraivadas de acusações, se mantêm firmes. 
Depois, a verdade vem a ser oferecida e não imposta, acreditando na voz da consciência, muitas vezes abafada, mas sempre presente, por meio da qual o Espírito Santo suscita em todas as pessoas a busca do bem. Em algum momento as pessoas se sentirão provocadas pela força da retidão! Além disso, respeitar as opções dos outros não significa obrigatoriamente apoiá-las. Ninguém pode nos obrigar a assinar um manifesto a favor do erro patente, cujos frutos se fazem imediatamente notar!

E por falar em frutos, não é difícil notar a quantidade de crianças, adolescentes e jovens sem referências familiares sólidas, como resultado de algumas gerações até estimuladas ao divórcio. Vale continuar, de nossa parte, a fazer propaganda da família estável, dos filhos considerados dom de Deus, do relacionamento entre homem e mulher vivido segundo a lei de Deus. Retrógados? Tradicionais? Antes, corajosos, sem medo de pôr à disposição nosso modo de viver e entender a existência humana.

Mas as incompreensões são inevitáveis. Com o Apóstolo São Pedro, podemos tomar posição: "Quem é que vos fará mal, se vos esforçais por fazer o bem? Mais que isso, se tiverdes que sofrer por causa da justiça, felizes de vós! Não tenhais medo de suas intimidações, nem vos deixeis perturbar. Antes, declarai santo, em vossos corações, o Senhor Jesus Cristo e estai sempre prontos a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que a pedir. Fazei-o, porém, com mansidão e respeito e com boa consciência.

Então, se em alguma coisa fordes difamados, ficarão com vergonha aqueles que ultrajam o vosso bom procedimento em Cristo. Pois será melhor sofrer praticando o bem, se tal for a vontade de Deus, do que praticando o mal. De fato, também Cristo morreu, uma vez por todas, por causa dos pecados, o justo pelos injustos, a fim de nos conduzir a Deus. Sofreu a morte, na existência humana, mas recebeu nova vida no Espírito" (I Pd 3, 15-18).

Para dar razões da esperança que em nós existe, é preciso não fugir da convivência com o que é diferente. Antes, com a necessária formação, aprender a dialogar, escutando as motivações das outras pessoas. O respeito mútuo fará vir à tona os verdadeiros valores. Aos cristãos caberá estar atentos ao que existe de mais humano, o mistério mais profundo da consciência.
Pode também acontecer que a brecha aberta pelo próprio Deus nos corações seja o mistério da dor. Por ela só pode passar o amor gratuito, livre, que ilumina todos os espaços. Muitas pessoas, aguerridas em suas batalhas verbais, escondem angústias terríveis, para as quais não há resposta senão no mistério de Cristo morto e ressuscitado, o Senhor em quem acreditamos. Ele é o melhor e definitivo presente que podemos oferecer a todos. O Espírito da verdade, prometido por Jesus, nos dê, também na atual geração, a necessária lucidez para o testemunho corajoso do Evangelho.




Dom Alberto Taveira Corrêa

Eterno ou erótico: o que o sacia?

sábado, 18 de junho de 2011 Diego Tales

É certo que no homem há o desejo pelo prazer, o desejo de possuir coisas e pessoas, a vontade de experimentar novos sentimentos e sensações a todo momento. Muitas vezes, essas situações revelam o nosso vazio e nos angustiam logo que experimentadas.
Isso ocorre com todos nós e, na modernidade, este desejo de possuir tudo e todos é potencializado pelas novas tecnologias que nos abrem uma gama incontável de possibilidades. Somos bombardeados por meio de palavras, imagens e sons que nos envolvem rapidamente. O mais grave é que alguns conteúdos nos transformam em objetos, e quando menos esperamos, estamos fisgados pelos chamados conteúdos eróticos.
Dessa forma, a busca do prazer transforma-se em uma verdadeira enrascada, principalmente quando acessamos os conteúdos chamados “Adultos”, que começam com um ensaio fotográfico mais sensual, e o mesmo site o leva para outro mais quente, e logo há alguém refém de vídeos e fotos chamados pornográficos.
Esses conteúdos são uma mentira, a qual nos envolve de tal forma que acabamos por ter a nossa vida dirigida em razão do prazer, da satisfação, do gozo, e quando paramos para pensar nos sentimos distantes de Deus, na angústia e na solidão.
Este desejo de ser “feliz”, buscando o que está fora de nós, pode ser um grande instrumento para a experiência do homem com o Senhor, da mesma forma que pode ser a causa de nossa escravidão ao erro. Assim foi com Santo Agostinho, que testemunhou na obra “Confissões” o quanto buscava no erótico a razão da sua vida, a ponto de afirmar: “Eis que eu Te procurava fora, e Tu estavas dentro de mim”.
Platão, um dos mais importantes filósofos da Grécia antiga, em sua obra nominada “Banquete”, narra o nascimento do mito Eros, segundo ele este é pobre, sujo, hirsuto, descalço, sem teto, e está sempre à espreita do belo dos corpos e da alma, com sagazes ardis. Ele não é belo como geralmente se crê, mas é extremamente astuto.
O Papa Bento XVI, em sua Encíclica Deus caritas est, ensina que o eros necessita de disciplina, de purificação para dar ao homem não o prazer de um instante, mas uma encontro verdadeiro com o eterno. Segundo o Santo Padre o modo de exaltar o corpo, a que assistimos hoje, é enganador. O eros degradado a puro sexo torna-se mercadoria, uma coisa, que se pode comprar e vender; assim, o próprio homem torna-se mercadoria.
Existe desta forma, uma significativa relação entre a busca pela insaciabilidade com a santidade. Na outra vertente há o estrago que o desequilíbrio causa no homem quando ele reduz a sua vida ao erotismo.
Portanto, a busca por algo absoluto pode ser feito a partir da escolha certa, rompendo com o erotismo e e se abrindo à eternidade!
Quando decidimos não ser escravizados pelos apelos eróticos e todas as suas vertentes, podemos saciar a sede do nosso coração, fixando no amor incondicional a Deus e ao próximo, e tomar posse das palavras de São Pedro:
Senhor, a quem iríamos nós? Tu tu tens as palavras da vida eterna! (Jo, 6, 68).

Ricardo Gaiotti
Advogado, missionário da Canção Nova
ricardo@geracaophn.com

O valor da espera

Diego Tales

A castidade é totalmente essencial para a felicidade de um jovem. Não se deixe enganar e pensar que a maioria dos jovens tem relações sexuais. Não, não têm! Existe muito o que saber e pensar antes de se chegar a uma relação sexual.

As experiências sexuais entre adolescentes são um risco para seu corpo, para suas emoções e para seu futuro. É maravilhoso ver que cresce, nos Estados Unidos, cada vez mais a abstinência sexual entre o público juvenil (Veja a pesquisa).
É certo que existem jovens que decidem ter relações sexuais; mas são eles que terão de viver com as consequências de sua decisão. Existem muitas formas de expressar seu carinho sem ter relações íntimas. Trate de evitar as situações que intensifiquem as emoções sexuais; será mais difícil “frear” neste caso.
Carlos Beltramo diz que os beijos e as carícias movem os hormônios. Às vezes, você como jovem pode afirmar: “Os hormônios são incontroláveis”. E perguntamos: “Onde você esteve ontem à noite?”. Resposta: “Em um parque até as três da madrugada… Cheguei lá às 20 horas com minha namorada”. Portanto, quem escolheu? Quem entrou nessa situação? É normal que haja impulsividade se favorecemos as oportunidades: um selinho, outro selinho, um beijo… E depois: “Estamos cansados! Vamos para o sofá?”. Faça esta pergunta a você mesmo: “Por que fui para o apartamento com ela?” É como fogo sobre palha!
Existem jovens que pensam: “Se ela não aceitar, não me ama”. Sendo um sentimento, o enamoramento pode ser destruído facilmente pelas experiências negativas. O verdadeiro amor cresce, mesmo em meio a experiências difíceis.
Para viver a pureza (castidade), mantenha-se ocupado (a) com esportes e com as atividades de grupo.
Alguns jovens  veem a sexualidade como uma atividade de ócio prazerosa, por isso existe menos densidade no enamoramento, menos pretensão de eternidade. A experiência do enamoramento é a mais plena das experiências, não é eletiva, é surpreendente. Eu me surpreendo enamorado.
Se você e sua namorada ou namorado não puderem chegar a um acordo sobre esse tema, então talvez fosse melhor procurar outra pessoa que pense igual a você. Dizer “não” pode ser a melhor maneira de dizer “eu te amo de verdade”. A castidade não significa rejeição nem menosprezo ao amor. Significa defender o amor do egoísmo.
Repito: a castidade é totalmente essencial à felicidade do jovem. A masturbação e a pornografia fazem com que o homem procure o prazer ao ritmo de seu sexo. Gera prazer, sim, mas não treina para ser feliz. Não treina para amar.
As pessoas precisam crescer no aspecto da paciência. Esse é um déficit muito comum na sociedade moderna, que incentiva a gratificação instantânea desde a infância. Para reforçar a virtude da paciência, a pessoa não deve ser impaciente, porque sendo assim enfraquece a virtude e fortalece o defeito. Vale a pena desenvolver os bons costumes e esperar!

Martha Morales
http://www.almas.com.mx/br

Juntos em Cristo

quinta-feira, 16 de junho de 2011 Diego Tales

Apresentamos a catequese dirigida pelo Papa aos grupos de peregrinos do mundo inteiro, reunidos na Praça de São Pedro para a audiência geral.
Queridos irmãos e irmãs
Hoje eu gostaria de falar-vos sobre a visita pastoral à Croácia, que realizei no sábado e domingo passados. Foi uma viagem apostólica breve, que se desenvolveu inteiramente na capital, Zagreb, mas ao mesmo tempo rica de encontros e sobretudo de um intenso espírito de fé, já que os croatas são um povo profundamente católico. Renovo meu mais vivo agradecimento ao cardeal Bozanić, arcebispo de Zagreb, a Dom Srakić, presidente da Conferência Episcopal, e aos demais bispos da Croácia, como também ao presidente da República, pelo caloroso acolhimento que me ofereceu. Meu reconhecimento se dirige a todas as autoridades civis e a todos os que colaboraram, de diversas formas, para tal evento, especialmente às pessoas que ofereceram orações e sacrifícios por esta intenção.
“Juntos em Cristo”: este foi o lema da minha visita. Ele expressa, antes de tudo, a experiência de reencontrar-se todos unidos no nome de Cristo, a experiência de ser Igreja, manifestada na reunião do Povo de Deus ao redor do Sucessor de Pedro. Mas “Juntos em Cristo” tinha, neste caso, uma referência concreta à família: de fato, o principal motivo da minha visita era o 1º Dia Nacional das Famílias Católicas croatas, culminado com a Concelebração Eucarística do domingo pela manhã, que contou com a participação, no hipódromo de Zagreb, de uma grande multidão de fiéis. Foi muito importante, para mim, confirmar na fé sobretudo as famílias, que o Concílio Vaticano II chamou de “igrejas domésticas” (cf. Lumen gentium, 11). O Beato João Paulo II, que visitou a Croácia três vezes, deu uma grande importância ao papel da família na Igreja; assim, com esta viagem, eu quis dar continuidade a este aspecto do seu magistério. Na Europa de hoje, as nações de sólida tradição cristã têm uma especial responsabilidade na defesa e promoção do valor da família fundada no matrimônio, que é, portanto, decisiva, tanto no âmbito educativo como no social. Esta mensagem tinha uma particular relevância para a Croácia, que, rica em patrimônio espiritual, ético e cultural, se prepara para entrar na União Européia.
A Santa Missa foi celebrada no peculiar clima espiritual da novena de Pentecostes. Como em um grande “cenáculo” a céu aberto, as famílias croatas se reuniram em oração, invocando juntas o dom do Espírito Santo. Isso me deu a maneira de destacar o dom e o compromisso da comunhão na Igreja, assim como a oportunidade de incentivar os cônjuges em sua missão. Em nossos dias, enquanto infelizmente se constata a multiplicação das separações e dos divórcios, a fidelidade dos cônjuges se tornou em si um testemunho significativo do amor de Cristo, que permite viver o matrimônio para o que é, ou seja, a união de um homem e de uma mulher que, com a graça de Cristo, se amam e se ajudam durante a vida, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. A primeira educação na fé consiste exatamente no testemunho desta fidelidade ao pacto conjugal; dela, os filhos aprendem sem palavras que Deus é amor fiel, paciente, respeitoso e generoso. A fé no Deus que é Amor se transmite antes de tudo com o testemunho de uma fidelidade ao amor conjugal, que se traduz naturalmente em amor pelos filhos, fruto desta união. Mas esta fidelidade não é possível sem a graça de Deus, sem o apoio da fé e do Espírito Santo. Este é o motivo pelo qual Nossa Senhora não deixa de interceder diante do seu Filho, para que – como nas bodas de Caná – renove continuamente nos cônjuges o dom do “vinho bom”, isto é, da sua Graça, que permite viver em “uma só carne”, nas diversas idades e situações da vida.
Neste contexto de grande atenção à família, colocou-se muito bem a vigília com os jovens, realizada na noite do sábado, na praça Jelačić, coração da cidade de Zagreb. Lá, pude me encontrar com a nova geração croata e percebi toda a força da sua fé jovem, incentivada por um grande impulso rumo à vida e seu significado, rumo ao bem, à liberdade, em última instância, a Deus. Foi belo e comovente escutar esses jovens cantarem com alegria e entusiasmo e depois, no momento de escutar e rezar, recolherem-se em profundo silêncio! A eles repeti a pergunta que Jesus fez aos seus primeiros discípulos: “O que buscais?” (Jo 1, 38), mas lhes disse que Deus os busca antes e com mais empenho do que eles O buscam. E esta é a alegria da fé: descobrir que Deus nos ama primeiro! É uma descoberta que nos mantém sempre discípulos e sempre jovens no espírito! Este mistério, durante a vigília, foi vivido na oração de adoração eucarística: no silêncio, o nosso estar “juntos em Cristo” encontrou sua plenitude. Assim, meu convite a seguir Jesus foi eco da Palavra que Ele mesmo dirigiu ao coração dos jovens.
Outro momento que podemos definir como “cenáculo” foi a celebração das Vésperas na catedral, com os bispos, sacerdotes, religiosos e jovens que estão se formando nos seminários e noviciados. Também aqui experimentamos nosso ser “família” como comunidade eclesial. Na catedral de Zagreb se encontra o monumental túmulo do Beato cardeal Alojzije Stepinac, bispo e mártir. Ele, em nome de Cristo, opôs-se primeiro aos abusos do nazismo e do fascismo e, depois, aos do regime comunista. Foi aprisionado e recluído em seu povoado natal. Nomeado cardeal pelo Papa Pio XII, morreu em 1960, devido a uma doença contraída na prisão. À luz do seu testemunho, incentivei os bispos e presbíteros em seu ministério, exortando-os à comunhão e à missão apostólica; reapresentei aos consagrados a beleza e a radicalidade da sua forma de vida; convidei os seminaristas, noviços e noviças, a seguirem com alegria esse Cristo que os chamou pelo seu nome. Esse momento de oração, enriquecido com a presença de tantos irmãos e irmãs que dedicaram suas vidas ao Senhor, foi para mim de grande consolo, e rezo por que as famílias croatas sejam sempre terra fértil para o nascimento de numerosas e santas vocações ao serviço do Reino de Deus.
Muito significativo foi também o encontro com expoentes da sociedade civil, do mundo político, acadêmico, cultural e empresarial, com o corpo diplomático e com os líderes religiosos, reunidos no Teatro Nacional de Zagreb. Neste contexto, tive a grande alegria de prestar homenagem à grande tradição cultural croata, inseparável da sua história de fé e da presença viva da Igreja, promotora, ao longo destes séculos, de múltiplas instituições e sobretudo formadora de ilustres pesquisadores da verdade e do bem comum. Entre estes, recordei sobretudo o padre jesuíta Ruđer Bošković, grande cientista de quem este ano se cumpre o terceiro centenário de nascimento. Mais uma vez, aparece como algo evidente para todos nós a mais profunda vocação da Europa, que é a de proteger e renovar um humanismo que tem raízes cristãs e que pode ser definido como “católico”, isto é, universal e integral. Um humanismo que põe no centro a consciência do homem, sua abertura transcendente e, ao mesmo tempo, sua realidade histórica, capaz de inspirar projetos políticos diversificados, mas que convergem na construção de uma democracia substancial, fundada em valores éticos radicados na própria natureza humana. Conceber a Europa do ponto de vista de uma nação de antiga e sólida tradição cristã, que é parte integrante da civilização europeia, enquanto se prepara para entrar na união política, fez sentir novamente a urgência do desafio que interpela hoje todos os povos deste continente: o de não ter medo de Deus, do Deus de Jesus Cristo, que é Amor e Verdade e que não elimina nada da liberdade, mas que a restitui a si mesma e lhe dá o horizonte de uma esperança fiável.
Queridos amigos, cada vez que o Sucessor de Pedro realiza uma viagem apostólica, todo o corpo eclesial participa, de alguma forma, do dinamismo de comunhão e de missão próprio do seu ministério. Agradeço a todos os que me acompanharam e apoiaram com a oração, obtendo que minha visita pastoral se desenvolvesse otimamente. Agora, enquanto damos graças ao Senhor por este grande dom, nós lhe pedimos, por intercessão de Nossa Senhora, Rainha dos Croatas, que tudo o que se pôde semear dê fruto abundante, pelas famílias croatas, por toda a nação e por toda a Europa.
No final da audiência, o Papa cumprimentou os peregrinos em vários idiomas. Em português, disse:
Queridos irmãos e irmãs
Hoje gostaria de comentar brevemente a minha Visita Pastoral à Croácia, realizada no sábado e domingo passados, tendo como lema “juntos em Cristo”. O motivo principal da visita era a Primeira Jornada Nacional das famílias católicas croatas, cujo ponto culminante foi a celebração eucarística dominical, no hipódromo de Zagreb. Vivida no contexto da novena de Pentecostes, o clima espiritual se assemelhava a um grande cenáculo, com as famílias invocando juntas o dom do Espírito Santo. No dia anterior, ao entardecer, houve uma vigília com os jovens. Propus-lhes a pergunta que Jesus fez aos seus primeiros discípulos: “Que procurais?”, lembrando-lhes que a alegria da fé é descobrir que Deus é o primeiro a amar-nos. Outros dois momentos importantes da minha visita foram a celebração das vésperas na Catedral, com os bispos, sacerdotes, religiosos, seminaristas e noviços, e o Encontro no Teatro Nacional de Zagreb com expoentes ilustres da sociedade civil e religiosa, aos quais, falando da grande tradição cultural croata, recordei a profunda vocação da Europa de zelar e renovar um humanismo que possui raízes cristãs.
Amados peregrinos de língua portuguesa, sede bem-vindos! A todos saúdo com grande afeto e alegria, de modo especial a quantos vieram de Portugal e do Brasil com o desejo de encontrar o Sucessor de Pedro. Desça a minha bênção sobre vós, vossas famílias e comunidades. Ide em paz!
Fonte: Zenit